OCDE e as relações com o Brasil
Escrito por Ivan Piseta e Monalisa Ceolin/Portal Politize!
O que significaria a adesão do Brasil à Organização para a Cooperação
Econômica e o Desenvolvimento (OCDE)?
Em maio
de 2017, o Brasil enviou sua candidatura à membresia plena da Organização para
a Cooperação Econômica e o Desenvolvimento (OCDE). Desde a década de 1990, o
país já tem participado de diversos comitês de forma plena ou apenas como um
observador, e assim se engajado em diversas atividades da instituição.
O que
significaria, portanto, uma adesão plena à OCDE? Como isso modificaria a
relação com a organização? Neste post, o Politize! te explica o que você
precisa saber sobre as relações do Brasil com a OCDE.
O que é a OCDE, como surgiu e como funciona?
A
Organização para a Cooperação Econômica e o Desenvolvimento (OCDE) é uma
organização internacional com sede em Paris, formada pelas maiores economias do
mundo.
A OCDE atua
como um think tank dedicado à pesquisa e estudos para o aconselhamento a
respeito de políticas públicas nas mais diversas áreas, e à troca de
experiências entre países membros e parceiros.
A origem
da OCDE remonta à reconstrução da Europa no pós-guerra. Com o Plano Marshall –
um plano em que os Estados Unidos enviou ajuda externa à Europa para a sua
reconstrução após a Segunda Guerra Mundial – os países da Europa Ocidental
criaram a Organização Europeia para a Cooperação Econômica (OECE) para
coordenar a distribuição dos recursos de ajuda externa enviada pelos Estados
Unidos ao continente europeu.
Além
disso, a OECE propunha a remoção de barreiras tarifárias estabelecidas desde a
Grande Depressão de 1929. A instituição era formada por 18 países europeus. Por
meio do financiamento das chamadas importações essenciais, o objetivo da
organização antecessora à OCDE foi a retomada do crescimento econômico e
posterior o aumento de consumo da Europa Ocidental.
Superado
esse momento, com a retomada do crescimento econômico europeu e o fim do Plano
Marshall, teve-se em vista que a manutenção da estabilidade econômica
dependeria conjuntamente dos rumos do desenvolvimento econômico global.
Assim,
passaram-se a exigir reformas na estrutura da OECE, culminando com a Convenção
de 1960, que criou a OCDE. Inicialmente, os membros da OCDE eram os mesmos 18
Estados europeus da antiga organização, somando-se outros 17 com o passar dos
anos, como pode ser visto na tabela abaixo.
Com
objetivos mais amplos que o da sua antecessora, a OCDE surge com vocação
internacional para consolidar o modelo econômico liberal adotado pelos países
desenvolvidos no pós-guerra, em complementação aos instrumentos do Banco
Mundial, FMI e GATT.
O que mudou a partir da OCDE e das novas tendências mundiais?
Se o
Plano Marshall marca a constituição do Sistema de Cooperação Internacional para
o Desenvolvimento, a criação da OCDE pode ser considerada o marco para as
relações de cooperação para o desenvolvimento Norte-Sul.
Isso
porque esse realinhamento da cooperação para o desenvolvimento coincide com a
eleição da pobreza como a temática mais importante da agenda desenvolvimentista
das Organizações Internacionais.
Nesse
sentido, passou-se a ter em vista que o crescimento econômico não significaria
necessariamente o bem-estar e a redução das desigualdades, e que não poderia
ser medido apenas pelo Produto Interno Bruto (PIB). É alinhada a essa visão que
surgiu na década de 1960 a famosa crítica do ex-senador dos Estados Unidos,
Bobby Kennedy, que afirmou que o PIB “mede tudo, exceto aquilo que faz a vida
valer a pena”, e décadas mais tarde, a declaração da ex-presidente Dilma
Rousseff de que “uma grande nação não se mede pelo PIB”.
Desse
modo, a ressignificação do desenvolvimento econômico levou às Organizações
Internacionais de cunho desenvolvimentista a adotarem princípios de
sustentabilidade, inclusão, e equilíbrio ao crescimento econômico.
Afinal,
uma boa governança entre as instituições, garante o livre funcionamento do
mercado, o cumprimento dos direitos de propriedade, e uma boa coordenação entre
os setores público e privado, bem como o Terceiro Setor.
Assim, a
OCDE, como uma organização geradora de conhecimento, passou a investir em
técnicas de mensuração do desenvolvimento para atribuir categorias e
prioridades aos países subdesenvolvidos que receberiam ajuda de países mais
desenvolvidos por meio da cooperação.
Como o Brasil é classificado pela OCDE?
Desde
2014, o Brasil é considerado como um país de renda média-alta pela OCDE,
passando a receber menos recursos a nível Federal dos países do Norte e de
Organizações Internacionais, como a União Europeia.
Por ter
atingido esse patamar, a OCDE e os países do Norte acabaram colocando o enfoque
da Cooperação para o Desenvolvimento brasileiro na mão de atores não-estatais,
como organizações da sociedade civil. Além disso, o Brasil tem alcançado um
papel de doador, ou ao menos redirecionador de recursos externos, promovendo
desenvolvimento nos países do Sul por meio da chamada cooperação trilateral.
Histórico das relações entre OCDE e Brasil
Mas além
da abordagem sobre a ajuda externa, as relações do Brasil com a OCDE
desenvolveram-se em uma série de temáticas desde a década de 1990.
Atualmente,
a agenda comum Brasil-OCDE promove a integração dinâmica do comércio mundial, o
aperfeiçoamento de programas sociais e educacionais (não apenas no Brasil, mas
do Brasil para o mundo) e a criação de empregos por meio da qualificação da mão
de obra, entre outros.
Oficialmente,
as relações entre o Brasil e a União Europeia iniciaram-se em 1991 com a
realização de uma Missão Exploratória à Organização. Por parte do Brasil, além
do contexto de ampliação da atuação da OCDE em relação ao desenvolvimento, a
Missão Exploratória tinha o objetivo de avaliar o processo de admissão de novos
membros, e o funcionamento dos principais órgãos dessa organização
internacional e identificar, assim, a quais comitês e instrumentos o Brasil
poderia vir a se associar.
Desde
1994 o país é membro do Centro de Desenvolvimento da OCDE, que é um órgão de
pesquisa por excelência, focado nos problemas socioeconômicos dos países em
desenvolvimento. No Brasil, por exemplo, diversos núcleos de pesquisa
contribuem para o levantamento desses dados, como a Fundação Getúlio Vargas
(FGV), a Universidade de São Paulo (USP) e até mesmo o Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada (IPEA).
Essas
pesquisas dão base às recomendações de políticas que a OCDE promove tanto aos
países membros quanto aos não-membros. Mas, além disso, o órgão é responsável
pela promoção da troca de experiências.
Nesse
sentido, com a adesão ao Centro de Desenvolvimento na década de 1990, o Brasil
passou a participar de diversos seminários no âmbito do projeto Diálogos sobre
Políticas, além de ter sediado alguns deles, como o Seminário sobre
Investimentos na América Latina (julho de 1996).
Em
seguida, o ingresso do Brasil no Comitê do Aço em 1996 se mostrou importante
instrumento para o conhecimento das tendências do mercado siderúrgico mundial e
o estimulou uma autoanálise sobre o funcionamento do setor no país, além de ter
passado a ser um importante âmbito para resoluções de pendências bilaterais com
importadores de aço brasileiro.
A
inserção no Comitê do Aço permite a participação no Brasil em importantes foros
de discussão, como a atual proposta de diminuição da produção mundial de aço,
reduzindo tanto impactos climáticos no meio ambiente quanto econômicos para os
produtores mundiais.
Além do
Comitê do Aço, o Brasil participa de outros 14 órgãos da OCDE, em alguns de
forma plena, como no Comitê de Comércio e do Comitê de Investimentos
Internacionais e Empresas Multinacionais (CIME), e alguns apenas como
observador, como é o caso do Comitê de Agricultura.
Com o
sucesso do desenvolvimento econômico nos anos 2000, o Brasil foi convidado em
2007 para ampliar seu engajamento na Organização junto a outros países
emergentes (África do Sul, China, Índia e Indonésia), intitulados de “parceiros
estratégicos” da OCDE. Logo em 2015, o governo brasileiro assinou um Acordo de
Cooperação, durante a Reunião Ministerial do Conselho em Paris, com o objetivo
de fortalecer a cooperação entre o país e a organização. A partir desse acordo,
foi elaborado também um plano de trabalho conjunto para 2016-2017.
Segundo o
governo brasileiro, esse acordo está alinhado com o objetivo de retomada do
crescimento econômico no país, com bases sustentáveis e inclusivas. A ideia é
gerar um melhor ambiente para a produtividade interna e atrativo para
investidores externos. Para isso, cita-se uma maior qualificação das populações
internas, gastos públicos mais eficientes e políticas de inovação tecnológica.
Adesão do Brasil à OCDE, o que isso significaria?
Segundo o
Ministro das Relações Exteriores Aloysio Nunes,
“A
acessão do Brasil, nesse contexto, terá o mérito de conferir maior coerência e
consistência à participação brasileira, enquanto permite que possamos melhor
influenciar esses debates.”
Assim,
desde maio de 2017, o Brasil procura a adesão à OCDE. Na época, o pedido formal
foi assinado pelo Ministro de Relações Exteriores Aloysio Nunes e pelo Ministro
da Fazenda Henrique Meirelles. Entretanto, o projeto não foi adiante – a
instabilidade política e econômica do país pode ter sido o motivo.
Com a
eleição de Jair Bolsonaro, o tema voltou à pauta brasileira. Já no início do
seu mandato, o presidente viajou aos Estados Unidos para uma visita oficial a
Donald Trump – a intenção era buscar apoio a entrada do país na OCDE. No
momento, o presidente estadunidense chegou a declarar “que estava apoiando os
esforços brasileiros para entrar na OCDE”.
Entretanto,
os críticos do governo que o apoio saiu caro para o Brasil. Isso porque – em
troca do apoio estadunidense – o Brasil aceitou abrir mão do status de país
emergente na OMC (Organização Mundial do Comércio).
Mas o que isso significa?
O status
de país emergente garantia ao Brasil um tratamento especial e diferenciado nas
negociações comerciais – assim, o Brasil podia reivindicar prazos especiais e
flexibilidade para cumprir acordos dentro da Organização.
Além
disso, no decorrer do mesmo ano, o presidente Bolsonaro declarou uma série de
concessões aos Estados Unidos – como a isenção de vistos para cidadãos
estadunidenses – com o intuito de aproximação do presidente Trump.
Apesar
disso, em outubro de 2019, a agência de notícias Bloomberg publicou uma
reportagem afirmando que os Estados Unidos teria desistido de apoiar a adesão
brasileira a OCDE.
De acordo
com a agência, Mike Pompeo – Secretário de Estados dos Estados Unidos – havia
enviado uma carta ao secretário geral da OCDE, em agosto de 2019, afirmando que
“os Estados Unidos continua a preferir a ampliação do clube de países de forma
moderada para que seja considerado o planejamento de governança [da OCDE]” . Na
carta ainda, há o apoio para as candidaturas da Argentina e da Romênia.
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