Sob o
impacto do êxito do Plano Real, o maior desafio governo de Fernando Henrique
Cardoso foi manter a estabilização da moeda e, ao mesmo tempo, promover o
crescimento econômico.
Com
esse objetivo, o governo submeteu à aprovação do Congresso Nacional uma série
de medidas visando a alterar a Constituição Federal de 1988 e promover uma
mudança estrutural na feição do Estado brasileiro, na tentativa de adaptá-los
às novas realidades da economia mundial. Assim, determinados temas passaram a
fazer parte do cotidiano político nacional, tais como reforma administrativa e
previdenciária, desregulamentação de mercados, flexibilização das regras de
contratação de mão-de-obra e fim do monopólio estatal nas áreas de siderurgia,
energia elétrica e telecomunicações.
A
reforma da administração federal e a da previdência social, consideradas
fundamentais na redução dos gastos públicos, seriam longamente debatidas no
Congresso e sofreriam diversas modificações. O programa de privatizações,
objeto prioritário na estratégia do governo, foi alvo de críticas acirradas da
oposição, que questionava as avaliações sobre o valor das empresas e, em alguns
casos, como o da Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), o próprio valor estratégico
do setor. A despeito das críticas, o programa foi implementado com eficácia: o
setor de energia elétrica, na área de distribuição e geração regional, foi
completamente privatizado; o setor de telecomunicações, incluindo a Telebrás e
as empresas telefônicas estaduais, passou às mãos da iniciativa privada na
segunda metade de 1998; teve fim o monopólio da Petrobras sobre a exploração e
o refinamento do petróleo e sobre a exploração de gás natural; e o controle
acionário da CVRD passou, em maio de 1997, a um consórcio formado por bancos
nacionais e estrangeiros e fundos de pensão.
Em
1995, visando à desindexação da economia, o governo proibiu o reajuste
automático dos salários pela inflação e estabeleceu a livre negociação entre
patrões e empregados. Em novembro desse ano, uma medida provisória ampliou os
poderes do Banco Central para intervir, quando necessário, nas instituições
bancárias, com o objetivo de evitar que a crise que atingiu o setor -
resultante da queda das taxas da inflação, das medidas de contenção do consumo,
e da consequente diminuição dos lucros obtidos com a especulação financeira -
se alastrasse e comprometesse todo o sistema financeiro, e foi também
regulamentado o Programa de Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional
(Proer).
Fortemente
inserido nos mercados financeiros internacionais, o Brasil enfrentou, durante o
governo Fernando Henrique, um quadro internacional adverso, com sucessivas
crises econômicas externas, destacando-se a do México, iniciada em dezembro de
1994, e a da Rússia, que declarou moratória da sua dívida externa em 1998,
verificando-se nessas ocasiões uma expressiva saída de divisas do país. Em que
pese os fortes vínculos existentes entre a economia nacional e o capital
estrangeiro, o Brasil demonstrou capacidade superior a de outros países para
absorver as crises externas e se recuperar. A estabilização da economia, com a
contenção do processo inflacionário, permitiu o crescimento da renda média dos
trabalhadores assalariados. Contudo, os mecanismos utilizados na defesa da
moeda nacional e manutenção de altas taxas de juros implicaram um ritmo lento
de crescimento econômico e, em decorrência, a elevação do índice de desemprego,
que atingiu 5,6% em 1997 e 7,6% em 1998, segundo dados da Fundação Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (FIBGE).
No que
diz respeito à política agrária, a elevação das alíquotas de transmissão de
propriedades improdutivas, a aprovação de leis que possibilitaram a sua
desapropriação imediata e o aumento do número de famílias assentadas pelo
governo não foram suficientes para evitar a intensificação dos conflitos no
campo. Assistiu-se, no período, a diversas manifestações e ocupações de terra
promovidas pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), entidade que
congrega grande contingente de trabalhadores rurais e desempregados que
reivindicam a aceleração do processo de reforma agrária.
Em 4 de
junho, foi aprovada no Senado a emenda que permitia a reeleição para mandatos
do Executivo nos âmbitos federal, estadual e municipal. O presidente Fernando
Henrique Cardoso e o vice Marco Maciel candidataram-se à reeleição pela mesma
coligação que os levara ao poder em 1994, formada pelo PSDB, PFL e PTB, à qual
se reuniu o PPB. Mais uma vez favorecido pela estabilidade econômico-financeira
promovida pelo Plano Real, Fernando Henrique venceu o primeiro turno das
eleições realizadas em 4 de outubro de 1998, conquistando 53,06% dos votos
válidos, contra 31,71% conferidos a Luís Inácio Lula da Silva, candidato da
coligação encabeçada pelo Partido dos Trabalhadores (PT), e 10,97% a Ciro
Gomes, do Partido Popular Socialista (PPS). Tomou posse em 1º de janeiro de
1999. Com a reeleição, Fernando Henrique tornou-se o primeiro presidente da
história do Brasil a ocupar a chefia do Executivo por dois mandatos
consecutivos. Tomou posse em 1º de janeiro de 1999.
O
segundo mandato do presidente iniciou-se com uma ruptura na política cambial
até então praticada: em janeiro de 1999 o real sofreu uma desvalorização e o
Banco Central adotou a livre flutuação do dólar, o que contribuiu para o
aumento das exportações e a redução da taxa de juros. A implementação do acordo
com o Fundo Monetário Internacional (FMI), assinado no ano anterior, exigiria
do país o alcance de metas rígidas, entre elas um superávit fiscal elevado. Sob
esse aspecto, destacou-se a aprovação, pelo Congresso Nacional, em maio de
2000, da Lei de Responsabilidade Fiscal, que dispôs sobre o planejamento, a
execução e a elaboração de relatórios orçamentários. A necessidade de ampliar
as exportações brasileiras foi atendida, em parte, pelos resultados da produção
agroindustrial, com a estimativa de que a safra 2002-03 fosse de 115,2 milhões
de toneladas de grãos, um crescimento de 19,1% em relação à safra anterior, de
96,7 milhões de toneladas. Ainda na área econômica, o país enfrentou
dificuldades, entre elas, a maior crise de energia da história, entre 1º de
junho de 2001 e 1º de março de 2002, e que acarretou o racionamento de
eletricidade para todos os setores da sociedade. Em agosto de 2002, em meio ao
processo eleitoral, a desconfiança dos mercados, a elevação do 'risco Brasil'
na avaliação das agências internacionais e a disparada da cotação da moeda
americana fizeram com que o Brasil fechasse um acordo com o FMI da ordem de 30
bilhões de dólares, elevando o piso das reservas internacionais do país. O ano
de 2002 se encerrou com a inflação anual atingindo os dois dígitos e a taxa de
desemprego em 9,4%. Na intensa agenda internacional do governo, registraram-se
iniciativas como a realização, no Rio de Janeiro, em 1999, da cúpula de chefes
de Estado e de governo da União Europeia e da América Latina e, em setembro de
2001, em Brasília, a reunião, pela primeira vez, dos chefes de governo dos 12
países da América do Sul.
A reforma
agrária implementada levou, segundo dados do governo, ao assentamento de três
vezes mais famílias do que os realizados nos trinta anos anteriores. De modo
geral, a política diretamente aplicada à área social viria por meio da
continuidade de ações iniciadas no primeiro governo, como o Programa Comunidade
Solidária, ou da criação de novos programas. São exemplos o Programa de
Erradicação do Trabalho Infantil (PETI); o Programa Nacional de Fortalecimento
da Agricultura Familiar (Pronaf), o Plano Nacional de Qualificação Profissional
(Planfor); o Programa Garantia de Renda Mínima (PGRM), o Programa de Geração de
Emprego e Renda (Proger) e o programa de investimento em infraestrutura visando
à criação de novos empregos (Pró-Emprego). Em relação à infância, educação e
saúde, foram dirigidos ainda os programas Toda Criança na Escola (alimentação
escolar), Bolsa-escola; Programa de Saúde da Criança e Aleitamento Materno,
Programa de Combate ao Abuso e Exploração de Crianças e Adolescentes; Programa
de Saúde da Família (PSF) e Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS).
Na área da saúde, destacou-se a aprovação, pelo Congresso Nacional, da proposta
de regulamentação dos remédios genéricos em fevereiro de 1999 e, em setembro de
2000, da emenda constitucional que estabeleceu a vinculação orçamentária da
área da Saúde, determinando que os gastos da União crescessem de acordo com a
variação anual do PIB e da inflação. Distinguiu-se, ainda, o programa de
combate a AIDS, que se tornou referência internacional. No final de 2001, um
surto de dengue atingiu grandes proporções em diversas cidades do país, como o
Rio de Janeiro. As grandes cidades e suas áreas metropolitanas foram também o
principal espaço do crescimento expressivo da violência, apesar dos planos anunciados
pelo governo para a segurança pública, como o de 2000, que previa investimentos
de três bilhões de reais. Entre as iniciativas do Ministério da Educação, ao
final do período, o governo obteve a marca de 97% das crianças na escola,
contrastado com o índice de 88% registrado em 1994. No campo da cultura, um dos
principais instrumentos da estratégia que uniu o Estado e o mercado foi a Lei
Rouanet. Além do incentivo ao cinema brasileiro, devem ser citados, entre
outros, o investimento prioritário nas bibliotecas públicas e o programa Monumental,
de recuperação do patrimônio histórico.
Em
1999, o relatório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD)
situou o Brasil no ápice da concentração de renda entre 174 países do mundo.
Parte dos anos FHC foi também retratada no Censo realizado em 2000 pelo IBGE,
cobrindo a década de 1990. Os brasileiros somavam, naquele ano, 169 milhões, e
o censo alternou bons e maus indicadores, prevalecendo, em linhas gerais, um
saldo positivo. Assim, permaneceu a desigualdade de renda - a metade mais pobre
representava 12% da renda total e o país registrou uma das piores taxas de
analfabetismo da América Latina, equivalente a 17,6 milhões de pessoas. Por
outro lado, a renda média subiu 41,8%; o número de domicílios com saneamento
básico cresceu e a taxa de analfabetismo caiu de 19,7% para 12,8%. No final de
2002, o presidente Fernando Henrique Cardoso foi considerado pelas Nações
Unidas a autoridade mundial que mais se destacou naquele ano no campo do
desenvolvimento humano. Nesse mesmo ano, com a vitória de Luiz Inácio Lula da
Silva nas eleições presidenciais de 2002, o presidente Fernando Henrique
Cardoso encaminhou o processo de transição de governo com representantes das
duas equipes.
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