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Período Regencial



Os governos regenciais
A abdicação de D. Pedro I provocou um vazio político no país, acirrando a disputa pelo poder entre as duas principais correntes do Império: liberais exaltados e liberais moderados. O grupo dos exaltados era formado, principalmente, pelas camadas médias urbanas, enquanto que os moderados eram constituídos pelos representantes da aristocracia rural. Essas duas correntes políticas compunham o chamado Partido Brasileiro e tinham-se aliado para derrubar D. Pedro I do poder e, com ele, os absolutistas do Partido Português, seus aliados. A abdicação pode ser considerada a derrota desse grupo e a vitória da oposição, que era constituída por diferentes grupos sociais, cada um deles com seus próprios objetivos.
Conseguido o seu intento, a aliança se desfez e cada grupo passou a lutar para conseguir se instalar no poder. Os liberais moderados redigiram, no dia seguinte à abdicação, um documento intitulado Proclamação em Nome da Assembleia Geral aos Povos do Brasil, no qual informavam sobre os acontecimentos, afirmavam seu apoio aos regentes nomeados e aconselhavam prudência e moderação à população, e que se observasse a Constituição e respeitasse os novos governantes. Em uma de suas passagens o documento dizia:
"Um acontecimento extraordinário veio surpreender todos os cálculos da humana prudência; uma revolução gloriosa foi operada pelos esforços e patriótica união do povo e tropa do Rio de Janeiro, sem que fosse derramada uma só gota de sangue; sucesso ainda não visto até hoje, e que deve honrar a vossa moderação, energia e o estado a que haveis chegado (...) Brasileiros! Um Príncipe mal aconselhado, trazido ao precipício por paixões violentas e desgraçados prejuízos antirracionais, cedeu à força da opinião pública, tão briosamente declarada, e reconheceu que não podia ser mais o Imperador dos Brasileiros."
Já o grupo dos liberais exaltados via esse momento como a possibilidade de transformações mais radicais, maior liberalização do regime e de mais participação nos destinos do Império. Entendia que, afastados do governo, junto com D. Pedro, os portugueses identificados com o absolutismo, haveria condições de aqui se desenvolverem os ideais liberais, revestidos de um caráter nacionalista. No entanto, os portugueses tinham se reorganizado e lutavam, agora, pela volta de D. Pedro ao trono brasileiro, sendo por isso chamados de restauradores. E, ao mesmo tempo, o governo era dominado pelo grupo dos moderados.
Dessa forma, o movimento da abdicação transformou-se, para os exaltados, conforme comentou na época o político Teófilo Ottoni, numa verdadeira Journée des Dupes (Jornada ou Dia dos Logrados), pois não conseguiram chegar ao poder, além de verem suas propostas esquecidas, apesar de terem participado ativamente para a deposição de D. Pedro I. Perceberam, portanto, que tinham lutado pelos outros. Assim, eram três as tendências políticas em jogo no cenário político brasileiro a partir de 1831: os restauradores, ou caramurus; os liberais moderados, ou chimangos; e os liberais exaltados, ou farroupilhas ou, ainda, jurujubas.
Em meio a esse quadro de agitações políticas, era necessário organizar o novo governo, já que a Constituição do Império estabelecia que, no caso de abdicação do imperador, o governo brasileiro seria exercido por um conselho de três regentes, eleitos pelo Legislativo, enquanto Pedro de Alcântara, o príncipe herdeiro, não atingisse a maioridade. Desse modo, cumprindo o preceito constitucional, teve início o Governo das Regências, que passou por três etapas:
Regência Trina Provisória - de 7 de abril a 17 de junho de 1831;
Regência Trina Permanente - de 17 de junho de 1831 a 12 de outubro de 1835;
Regência Una - de 12 de outubro de 1835 a 23 de julho de 1840.
A Regência Trina Provisória
Como no dia da abdicação de D. Pedro o Parlamento brasileiro encontrava-se em férias, não havia no Rio de Janeiro número suficiente de deputados e senadores que pudesse eleger os três regentes. Os poucos parlamentares que se encontravam na cidade elegeram, em caráter de emergência, uma Regência Trina Provisória.
Essa Regência, que governou o país por aproximadamente três meses, era composta pelos senadores Nicolau de Campos Vergueiro e José Joaquim de Campos (Marquês de Caravelas) e pelo brigadeiro Francisco de Lima e Silva, pai do Duque de Caxias. A pressa em se eleger a Regência deveu-se ao temor do acirramento da agitação popular, que a própria camada dominante havia estimulado para atingir seu objetivo – a abdicação de D. Pedro I.
A principal medida tomada por essa Regência foi convocar os demais parlamentares para que elegessem, em Assembleia Geral, a Regência Trina Permanente. Apesar de manter as estruturas políticas do Império autoritário, a Regência Provisória tinha um caráter liberal e antiabsolutista. Era o início do chamado avanço liberal, que durou até 1837, quando os grupos políticos das províncias alcançaram um maior grau de autonomia. Entre outras medidas tomadas pela Regência Provisória destacam-se:
- Reintegração do Ministério dos Brasileiros, demitido por D. Pedro I em abril de 1831.
- Promulgação de uma lei restringindo as atribuições do Poder Moderador, que temporariamente seria exercido pelos regentes, vetando-lhes o direito de dissolver a Câmara dos Deputados, decretar a suspensão das garantias constitucionais e conceder títulos de nobreza e condecorações.
- Anistia aos presos políticos para abafar a agitação política.
- Proibição dos ajuntamentos noturnos em praça pública, tornando inafiançáveis os crimes em que ocorresse prisão em flagrante.
Nesse momento, a rivalidade entre brasileiros e portugueses se aprofundava. No final de abril, as manifestações antilusitanas se acirraram. Ao grito de "mata marinheiro" e "mata bicudo", portugueses eram perseguidos e tinham suas casas de comércio invadidas e saqueadas. Os que ocupavam cargos públicos eram depostos. Em várias ocasiões pediu-se a expulsão de portugueses, especialmente daqueles que detinham o monopólio do comércio e, por conta disso, eram o alvo preferido da população.
O Jornal do Comércio publicava, em 15 de julho de 1831, uma representação ao governo com cerca de 400 assinaturas, na qual a expulsão dos portugueses era proposta nos seguintes termos:
"Senhor,
O povo e a tropa da capital do Rio de Janeiro são de novo reunidos para pedir a expulsão para fora do Império dos acérrimos inimigos da Nação Brasileira, que tantos males lhe hão causado, e que são incansáveis em tratar solapadamente a sua ruína; convém, pois, Senhor, que tais homens nocivos ao bem-estar não continuem a viver no meio de nós.
A Regência Trina Permanente
Instalada a Assembleia Geral, foi eleita em 17 de junho de 1831 a Regência Trina Permanente, que ficou composta pelos deputados José da Costa Carvalho, político do sul do país, João Bráulio Muniz, do norte, e novamente pelo brigadeiro Francisco de Lima e Silva. Tal composição representava, por um lado, uma tentativa de equilíbrio entre as forças do norte e do sul do país; por outro lado, a permanência do brigadeiro Francisco de Lima e Silva era a garantia do controle da situação e da manutenção da ordem pública.
Característica importante dessa Regência era sua composição por deputados, diferentemente da anterior, formada por senadores. A Câmara dos Deputados simbolizava a defesa da liberdade e era representativa dos interesses do grupo dos moderados. A Câmara tornou-se um centro de pressão em favor das mudanças constitucionais, em contraste com o Senado, que simbolizava a oposição às reformas e era considerado pelos moderados um "ninho de restauradores".
A Câmara logo firmou posição ao aprovar, em 14 de junho, lei que tirava dos regentes as atribuições do Poder Moderador. Por essa lei, os regentes ficavam impedidos de dissolver a Câmara dos Deputados, de conceder títulos de nobreza, de decretar a suspensão das garantias constitucionais e de negociar tratados com potências estrangeiras, como, por exemplo, os tratados referentes ao tráfico negreiro intercontinental.
Figura de destaque nessa Regência foi o padre Diogo Antônio Feijó, nomeado ministro da Justiça, cargo que assumiu sob a condição de que lhe garantissem grande autonomia de ação. Feijó teve carta branca para castigar os desordeiros e os delinquentes, o direito de exonerar e responsabilizar os funcionários públicos negligentes ou prevaricadores e a possibilidade de manter um jornal sob sua responsabilidade direta.
Feijó teve atuação enérgica na repressão às agitações populares e aos levantes militares que ocorreram na capital e em diversos pontos do país nesse período. Para garantir a integridade territorial e a defesa da ordem pública, criou, em 18 de agosto de 1831, o Corpo de Guardas Municipais Permanentes no Rio de Janeiro e a Guarda Nacional na corte e em todas as províncias. Órgãos subordinados ao Ministério da Justiça, se constituíram na principal força armada do Império.
A Regência Una de Feijó
Conforme estipulado pelo Ato Adicional, realizou-se, em 7 de abril de 1835, a eleição para o cargo de regente único. Duas candidaturas destacaram-se logo de início, sendo ambos os candidatos do Partido Moderado: o paulista Diogo Antônio Feijó, apoiado pelas forças políticas do sul e também pela Sociedade Defensora do Rio de Janeiro; e o pernambucano Antônio Francisco de Paula Holanda Cavalcanti de Alburquerque, cuja família era dona de cerca de um terço dos engenhos de açúcar de Pernambuco, legítimo representante da aristocracia nordestina.
Feijó venceu por pequena diferença de votos (600), dos cerca de cinco mil eleitores do país, que, nessa época, tinha aproximadamente 5 milhões de habitantes. Segundo a Constituição Outorgada de 1824, os eleitores – cidadãos ativos – eram aqueles que votavam e podiam ser votados. O regente tomou posse no dia 12 de outubro de 1835, enfrentando oposição até dentro do próprio partido e uma grave situação de agitação no país. Notícias das províncias falavam de revoltas nos sertões do extremo norte: a Cabanagem no Grão-Pará; a dos escravos Malês, na Bahia; e no extremo sul, a Farroupilha.
Tentando reverter o quadro político desfavorável, Feijó e seus companheiros criam um novo partido, denominado Progressista. Contra ele, logo se ergueu um grupo chamado Regressista – porque queria o retorno à situação anterior ao Ato Adicional, ou seja, às condições políticas e institucionais anteriores às medidas descentralizadoras. Esse partido daria origem ao Partido Conservador, enquanto que os partidários do regente dariam origem ao Partido Liberal.
Feijó provocou a ira da aristocracia agrária ao manifestar-se publicamente em apoio ao fim da escravidão. Dizia ser uma "vergonhosa contradição com os princípios liberais que professamos, conservar homens escravos". Chegou a enviar uma missão a Londres para tratar, com o governo inglês, de medidas de repressão ao tráfico negreiro. Essa atitude aumentou o temor dos proprietários rurais, que passaram a assumir posições cada vez mais conservadoras.
Desentendeu-se também com a imprensa, que o atacava constantemente, e por isso assinou um decreto, em março de 1838, limitando sua liberdade. O autoritarismo do regente fazia aumentar a cada dia seu grupo de opositores, presentes também na Câmara e no Senado. Feijó teve sua atuação bastante limitada, sendo responsabilizado pelas revoltas sociais que se espalhavam por todo o país. Sentindo-se acuado e sem respaldo político, renunciou em 19 de setembro de 1837.
Esse primeiro momento das Regências (1831-1836) é caracterizado pela instabilidade política, mas, sobretudo, pelos projetos de liberdade e democracia. É o momento da Ação, baseado no princípio da liberdade, a que irá se contrapor, no segundo momento, o da Reação, a partir de 1836, baseado no princípio da autoridade, que virá com a posição centralizadora. 
Fonte: MultiRio

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