AFINAL,
O QUE É O POPULISMO?
Conceito
ainda é controverso entre estudiosos
Segundo o
dicionário, o populismo é uma prática que busca a simpatia das classes sociais
mais baixas, defendendo seus interesses através de políticas paternalistas e
assistencialistas. Mas por que será que esse é um termo tão polêmico e
debatido? Outras definições vêm para dividir ainda mais as opiniões. Segundo
Cas Mudde, professor da Universidade da Geórgia (EUA), o populismo é uma
ideologia rasa que considera que a sociedade se divide em dois grupos
antagônicos, o ‘povo’ e a ‘elite corrupta’”.
Essa versão
é bastante aceita academicamente e enfatizada por outros estudiosos, como Luiz
Ramiro (Universidade de Leicester – Reino Unido), que completa dizendo que
“tais grupos possuem interesses irreconciliáveis, o que leva a enfatizar a
soberania nacional ou popular”. Tal visão é a mais defendida por políticos
populistas, que sempre colocam em seus discursos, a visão “elite vs. nós
(povo)”, e naturalmente se colocam ao lado do povo. Essa aparente aproximação e
revolta contra o sistema econômico e político já mostrou-se muito eficaz para a
captação de votos e apoio em eleições, além de ser usada como justificativa
para ações políticas mais radicais que não seriam naturalmente aceitas.
Também é
importante observar que o populismo pode ser classificado tanto de direita,
quanto de esquerda. O que difere são as visões que se tem sobre as políticas
tomadas. O populismo de esquerda dirige seus ataques contra uma elite
econômica, que seria responsável por todos os problemas nacionais, enquanto o
de direita vê ameaças externas como o problema maior.
Além
disso, de acordo com Guillem Vidal, pesquisador do European University
Institute (Itália), os populismos de cada lado possuem definições distintas
para o termo “povo”, sendo essa a principal controvérsia entre eles. O povo
pode ser tanto uma concepção civil, quanto étnica. A direita defende o conceito
étnico, de onde surgem suas críticas contra a imigração. A esquerda define o
“nós” do ponto de vista social, que abrange a população como um todo (incluindo
imigrantes).
Na
América Latina, o populismo teve um papel bastante marcante na história de
alguns países e sua marca foi a relação direta entre o povo e os líderes
populistas, que falava diretamente com as pessoas de modo carismático e
popular.
HISTÓRICO DO POPULISMO
O
populismo já apareceu várias vezes na história, inclusive no Brasil e angariou
defensores e críticos durante sua trajetória. Por ser um fenômeno muito
particular, ele possui origens diferentes dependendo do país. Nos Estados
Unidos, o pensamento populista se originou do movimento Know nothing (“Sabe
Nada” em tradução livre), movimento de direita que surgiu na década de 1840
para fazer oposição à imigração irlandesa católica e alemã. Alguns protestantes
americanos viram essa migração como uma ameaça, por considerarem que os
estrangeiros roubariam seus empregos e influenciariam a cultura do país.
Em 1854,
o movimento criou o American Party (Partido Americano), que exigia restrição à
imigração e tinha como bandeira a proposta de exigir residência fixa mínima de
21 anos para fornecer cidadania americana para esses imigrantes. No ano
seguinte, houve uma divisão dentro do movimento entre os que eram pró e contra
a escravidão.
Já o
populismo de esquerda dos Estados Unidos começou também em 1880, pela
iniciativa de fazendeiros, devido à queda do preço do algodão no sul do país,
da seca e das altas taxas cobradas por banqueiros e empresários. Fundaram então
o People’s Party (Partido do Povo), que tinha como objetivo nacionalizar as
ferrovias, desfazer grandes acordos comerciais e exigir um máximo de 8 horas de
trabalho por dia.
Na
Europa, o populismo começou na Rússia, no fim do século 19. Conhecidos como
narodniks, os participantes desse movimento eram, na sua maioria, intelectuais
que tentaram gerar uma revolução camponesa contra os grandes proprietários de
terra, mas sem sucesso.
Mesmo sem
atingir seus objetivos, conseguiram influenciar a Europa oriental, de onde
surgiram vários partidos populistas agrários no começo do século XX.
POPULISMO LATINO-AMERICANO
Os
principais governos populistas da América Latina aconteceram no Brasil (Getúlio
Vargas, 1930-45/1951-54), no México (Lázaro Cárdenas 1934-40) e na Argentina
(Juan Domingo Perón 1946-55).
A crise
de 1929 e a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) aumentaram as tensões políticas
e sociais na América de um modo geral, levando muitos governos da América
Latina a controlar os movimentos sociais, que cresciam devido à insatisfação da
época. Algumas medidas foram tomadas para diminuir o desemprego, a fome,
aumentar os salários e melhorar as condições de trabalho. Porém, também houve o
uso da violência para coibir revoltas contra o governo, como perseguição a
membros de sindicatos opositores ao governo e a obediência forçada do movimento
operário às centrais sindicais governamentais. A Revolução Russa, de caráter
comunista, tinha acontecido em 1917 e os governos fizeram o possível para que
uma revolução semelhante não acontecesse na América Latina.
A crise
de 1929 afetou muito a economia da região, que ainda era predominantemente
agrícola e dependia muito da exportação de suas produções. A diversificação da
economia passou a ser uma prioridade, fazendo os governos adotarem políticas
para a industrialização. Essa diversificação se intensificou na Segunda Guerra
Mundial, já que foi preciso substituir as importações que não eram mais
produzidas pela Europa durante a guerra e porque a América se tornava mais
importante economicamente por assumir parte dessa produção.
VARGAS E O POPULISMO
A chamada
Era Vargas abarca o período em que Vargas esteve à frente do governo
brasileiro, entre 1930 e 1945, quando assumiu através de um golpe de Estado,
tirando do poder o presidente Washington Luís e impedindo a posse do
recém-eleito Júlio Prestes. A primeira fase do governo (1930-34) foi chamada de
governo provisório e sofreu oposição da revolta constitucionalista de 1932, que
pediu por novas eleições. Em 1934, uma nova constituição foi promulgada, a qual
deu mais poderes ao executivo, criou as bases da reforma trabalhista e
sancionou o voto secreto e o voto feminino.
Com
maioria no Congresso, Vargas se manteve no poder e iniciou o próximo mandato
(1934-37). Esse mandato foi marcado pela centralização de poder no Executivo
federal e foi encerrado com o decreto de estado de sítio, que Vargas implantou
alegando defender o país de uma “ameaça comunista”. Com a mesma justificativa,
anulou as eleições de 1937 e a constituição de 1934, passando a governar com
amplos poderes e iniciando o período do Estado Novo (1937-45). Nesse período,
censurou os meios de comunicação, reprimiu a atividade política, perseguiu
inimigos políticos, adotou medidas econômicas nacionalistas, criou a CLT
(Consolidação das Leis do Trabalho) e publicou o Código Penal e o Código de
Processo Penal. Também criou a Carteira de Trabalho, o salário mínimo e o
descanso semanal remunerado.
A derrota
do fascismo na segunda guerra foi a brecha para o crescimento da oposição ao
Estado Novo. O governo foi obrigado a convocar eleições gerais, que foram
vencidas pelo general Dutra. Getúlio saía do poder, mas voltaria em 1951
através das eleições.
Vargas
sempre foi uma figura polêmica. Muitos acadêmicos classificam seu governo como
populista, cuja visão é a mais aceita, mas alguns chegam a considerar que ele
possuía características ou tendências fascistas. A primeira fase do seu mandato
– o Estado Novo – é considerada populista por não ter havido no Brasil um
partido único que ligasse os interesses do povo com o Estado, pelas medidas
trabalhistas tomadas e porque a violência empregada na repressão não foi tão
intensa quanto a da Europa, que na época vivia a segunda guerra. A repressão se
concentrava em perseguir inimigos do governo e abafar movimentos da oposição,
acusando-a frequentemente de querer implantar uma ditadura comunista no Brasil.
Por outro
lado, Vargas teve um papel importante na manutenção dos interesses das classes
capitalistas, como a oligarquia cafeeira e a burguesia industrial, contra as
quais ele havia se oposto inicialmente. Além disso, a estrutura hierárquica
militar da época foi responsável por modelar o Estado Novo e fortalecer o
discurso nacionalista, transformando o Estado e o exército nas instituições de
unidade e identidade da nação brasileira. Por fim, o Estado Novo teve
influência dos regimes fascistas vigentes na Polônia e na Itália, fazendo com
que alguns pesquisadores considerem que Vargas tendia mais para fascista do que
para o populista. De qualquer modo, essa visão continua a suscitar debates.
O POPULISMO ESTÁ RESSURGINDO?
Hoje em
dia, o populismo parece ter voltado a ganhar força, com políticos de diversos
países. Donald Trump, atual presidente dos Estados Unidos, Marine Le Pen,
candidata a presidente da França e Geert Wilders, candidato derrotado na
eleição holandesa de 2017 são classificados como políticos populistas de
direita. Em geral, eles adotam ou defendem medidas nacionalistas e
protecionistas, dando maior prioridade para políticas internas e fechando mais
suas fronteiras para o comércio internacional, para imigrantes e influências
culturais globais.
Na
Europa, o populismo também levanta a bandeira da independência dos países em
relação à União Europeia (UE), organização que aprofundou a integração
econômica, política e cultural no continente desde os anos 1990. Esse
sentimento contrário à UE é visto como um dos fatores que levaram ao Brexit,
plebiscito que levou à saída do Reino Unido da organização. O abandono da UE é
uma das bandeiras de Marine Le Pen, que também apoia a realização de um
plebiscito para avaliar a permanência ou não da França no bloco, caso vença as
eleições deste ano.
A
Alemanha também passará por um teste para avaliar a força do populismo nas suas
eleições em 2017. O partido Alternativa para a Alemanha (AfD, na sigla em
alemão) faz oposição às políticas da União Europeia e à política de refugiados
da atual primeira ministra, Angela Merkel.
Por outro
lado, a Grécia recém elegeu um presidente considerado populista de esquerda. O
partido Syriza chegou ao poder em 2015, assumindo o difícil desafio de lidar
com a crise econômica do país. Porém, não conseguiu muitas vantagens para a
Grécia, visto que foi aprovado um pacote de resgate financeiro que não foi
suficiente para tirá-la da crise, e ainda contou com o agravante do grande
fluxo de imigrantes que usam a região para entrar na Europa. A falta de manejo
correto dessas situações deixou o governo grego mais isolado politicamente dos
outros países e com poucas escolhas políticas.
De um
modo geral, o populismo tem aumentado seu poder de influência devido à crise
econômica internacional e à crise de refugiados, que leva populistas de direita
a defenderem a soberania nacional e a tomarem medidas independentes para lidar
com esses problemas mundiais.
Fonte:
politize!
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