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Base Nacional Comum Curricular - Língua Inglesa


LÍNGUA INGLESA
Aprender a língua inglesa propicia a criação de novas formas de engajamento e participação dos alunos em um mundo social cada vez mais globalizado e plural, em que as fronteiras entre países e interesses pessoais, locais, regionais, nacionais e transnacionais estão cada vez mais difusas e contraditórias. Assim, o estudo da língua inglesa pode possibilitar a todos o acesso aos saberes linguísticos necessários para engajamento e participação, contribuindo para o agenciamento crítico dos estudantes e para o exercício da cidadania ativa, além de ampliar as possibilidades de interação e mobilidade, abrindo novos percursos de construção de conhecimentos e de continuidade nos estudos. É esse caráter formativo que inscreve a aprendizagem de inglês em uma perspectiva de educação linguística, consciente e crítica, na qual as dimensões pedagógicas e políticas estão intrinsecamente ligadas.
Ensinar inglês com essa finalidade tem, para o currículo, três implicações importantes. A primeira é que esse caráter formativo obriga a rever as relações entre língua, território e cultura, na medida em que os falantes de inglês já não se encontram apenas nos países em que essa é a língua oficial. Esse fato provoca uma série de indagações, dentre elas, “Que inglês é esse que ensinamos na escola?”.
Alguns conceitos parecem já não atender as perspectivas de compreensão de uma língua que “viralizou” e se tornou “miscigenada”, como é o caso do conceito de língua estrangeira, fortemente criticado por seu viés eurocêntrico. Outras terminologias, mais recentemente propostas, também provocam um intenso debate no campo, tais como inglês como língua internacional, como língua global, como língua adicional, como língua franca, dentre outras. Em que pese as diferenças entre uma terminologia e outra, suas ênfases, pontos de contato e eventuais sobreposições, o tratamento dado ao componente na BNCC prioriza o foco da função social e política do inglês e, nesse sentido, passa a tratá-la em seu status de língua franca. O conceito não é novo e tem sido recontextualizado por teóricos do campo em estudos recentes que analisam os usos da língua inglesa no mundo contemporâneo. Nessa proposta, a língua inglesa não é mais aquela do “estrangeiro”, oriundo de países hegemônicos, cujos falantes servem de modelo a ser seguido, nem tampouco trata-se de uma variante da língua inglesa. Nessa perspectiva, são acolhidos e legitimados os usos que dela fazem falantes espalhados no mundo inteiro, com diferentes repertórios linguísticos e culturais, o que possibilita, por exemplo, questionar a visão de que o único inglês “correto” – e a ser ensinado – é aquele falado por estadunidenses ou britânicos.
Mais ainda, o tratamento do inglês como língua franca o desvincula da noção de pertencimento a um determinado território e, consequentemente, a culturas típicas de comunidades específicas, legitimando os usos da língua inglesa em seus contextos locais. Esse entendimento favorece uma educação linguística voltada para a interculturalidade, isto é, para o reconhecimento das (e o respeito às) diferenças, e para a compreensão de como elas são produzidas nas diversas práticas sociais de linguagem, o que favorece a reflexão crítica sobre diferentes modos de ver e de analisar o mundo, o(s) outro(s) e a si mesmo.
A segunda implicação diz respeito à ampliação da visão de letramento, ou melhor, dos multiletramentos, concebida também nas práticas sociais do mundo digital – no qual saber a língua inglesa potencializa as possibilidades de participação e circulação – que aproximam e entrelaçam diferentes semioses e linguagens (verbal, visual, corporal, audiovisual), em um contínuo processo de significação contextualizado, dialógico e ideológico. Concebendo a língua como construção social, o sujeito “interpreta”, “reinventa” os sentidos de modo situado, criando novas formas de identificar e expressar ideias, sentimentos e valores. Nesse sentido, ao assumir seu status de língua franca – uma língua que se materializa em usos híbridos, marcada pela fluidez e que se abre para a invenção de novas formas de dizer, impulsionada por falantes pluri/multilíngues e suas características multiculturais –, a língua inglesa torna-se um bem simbólico para falantes do mundo todo.
Por fim, a terceira implicação diz respeito a abordagens de ensino. Situar a língua inglesa em seu status de língua franca implica compreender que determinadas crenças – como a de que há um “inglês melhor” para se ensinar, ou um “nível de proficiência” específico a ser alcançado pelo aluno – precisam ser relativizadas. Isso exige do professor uma atitude de acolhimento e legitimação de diferentes formas de expressão na língua, como o uso de ain’t para fazer a negação, e não apenas formas “padrão” como isn’t ou aren’t. Em outras palavras, não queremos tratar esses usos como uma exceção, uma curiosidade local da língua, que foge ao “padrão” a ser seguido. Muito pelo contrário – é tratar usos locais do inglês e recursos linguísticos a eles relacionados na perspectiva de construção de um repertório linguístico, que deve ser analisado e disponibilizado ao aluno para dele fazer uso observando sempre a condição de inteligibilidade na interação linguística. Ou seja, o status de inglês como língua franca implica deslocá-la de um modelo ideal de falante, considerando a importância da cultura no ensino-aprendizagem da língua e buscando romper com aspectos relativos à “correção”, “precisão” e “proficiência” linguística.
Essas três implicações orientam os eixos organizadores propostos para o componente Língua Inglesa, apresentados a seguir.
O eixo Oralidade envolve as práticas de linguagem em situações de uso oral da língua inglesa, com foco na compreensão (ou escuta) e na produção oral (ou fala), articuladas pela negociação na construção de significados partilhados pelos interlocutores e/ou participantes envolvidos, com ou sem contato face a face. Assim, as práticas de linguagem oral presenciais, com contato face a face – tais como debates, entrevistas, conversas/diálogos, entre outras –, constituem gêneros orais nas quais as características dos textos, dos falantes envolvidos e seus “modos particulares de falar a língua”, que, por vezes, marcam suas identidades, devem ser considerados. Itens lexicais e estruturas linguísticas utilizados, pronúncia, entonação e ritmo empregados, por exemplo, acrescidos de estratégias de compreensão (compreensão global, específica e detalhada), de acomodação (resolução de conflitos) e de negociação (solicitação de esclarecimentos e confirmações, uso de paráfrases e exemplificação) constituem aspectos relevantes na configuração e na exploração dessas práticas. Em outros contextos, nos quais as práticas de uso oral acontecem sem o contato face a face – como assistir a filmes e programações via web ou TV ou ouvir músicas e mensagens publicitárias, entre outras –, a compreensão envolve escuta e observação atentas de outros elementos, relacionados principalmente ao contexto e aos usos da linguagem, às temáticas e a suas estruturas.
Além disso, a oralidade também proporciona o desenvolvimento de uma série de comportamentos e atitudes – como arriscar-se e se fazer compreender, dar voz e vez ao outro, entender e acolher a perspectiva do outro, superar mal-entendidos e lidar com a insegurança, por exemplo. Para o trabalho pedagógico, cabe ressaltar que diferentes recursos midiáticos verbo-visuais (cinema, internet, televisão, entre outros) constituem insumos autênticos e significativos, imprescindíveis para a instauração de práticas de uso/interação oral em sala de aula e de exploração de campos em que tais práticas possam ser trabalhadas. Nessas práticas, que articulam aspectos diversos das linguagens para além do verbal (tais como o visual, o sonoro, o gestual e o tátil), os estudantes terão oportunidades de vivência e reflexão sobre os usos orais/oralizados da língua inglesa.
O eixo Leitura aborda práticas de linguagem decorrentes da interação do leitor com o texto escrito, especialmente sob o foco da construção de significados, com base na compreensão e interpretação dos gêneros escritos em língua inglesa, que circulam nos diversos campos e esferas da sociedade.
As práticas de leitura em inglês promovem, por exemplo, o desenvolvimento de estratégias de reconhecimento textual (o uso de pistas verbais e não verbais para formulação de hipóteses e inferências) e de investigação sobre as formas pelas quais os contextos de produção favorecem processos de significação e reflexão crítica/problematização dos temas tratados.
O trabalho com gêneros verbais e híbridos, potencializados principalmente pelos meios digitais, possibilita vivenciar, de maneira significativa e situada, diferentes modos de leitura (ler para ter uma ideia geral do texto, buscar informações específicas, compreender detalhes etc.), bem como diferentes objetivos de leitura (ler para pesquisar, para revisar a própria escrita, em voz alta para expor ideias e argumentos, para agir no mundo, posicionando-se de forma crítica, entre outras). Além disso, as práticas leitoras em língua inglesa compreendem possibilidades variadas e contextos de uso das linguagens para pesquisa e ampliação de conhecimentos de temáticas significativas para os estudantes, com trabalhos de natureza interdisciplinar ou fruição estética de gêneros como poemas, peças de teatro etc.
A vivência em leitura a partir de práticas situadas, envolvendo o contato com gêneros escritos e multimodais variados, de importância para a vida escolar, social e cultural dos estudantes, bem como as perspectivas de análise e problematização a partir dessas leituras, corroboram para o desenvolvimento da leitura crítica e para a construção de um percurso criativo e autônomo de aprendizagem da língua.
Do ponto de vista metodológico, a apresentação de situações de leitura organizadas em pré-leitura, leitura e pós-leitura deve ser vista como potencializadora dessas aprendizagens de modo contextualizado e significativo para os estudantes, na perspectiva de um (re)dimensionamento das práticas e competências leitoras já existentes, especialmente em língua materna.
As práticas de produção de textos propostas no eixo Escrita consideram dois aspectos do ato de escrever. Por um lado, enfatizam sua natureza processual e colaborativa. Esse processo envolve movimentos ora coletivos, ora individuais, de planejamento-produção-revisão, nos quais são tomadas e avaliadas as decisões sobre as maneiras de comunicar o que se deseja, tendo em mente aspectos como o objetivo do texto, o suporte que lhe permitirá circulação social e seus possíveis leitores. Por outro lado, o ato de escrever é também concebido como prática social e reitera a finalidade da escrita condizente com essa prática, oportunizando aos alunos agir com protagonismo.
Trata-se, portanto, de uma escrita autoral, que se inicia com textos que utilizam poucos recursos verbais (mensagens, tirinhas, fotolegendas, adivinhas, entre outros) e se desenvolve para textos mais elaborados (autobiografias, esquetes, notícias, relatos de opinião, chat, fôlder, entre outros), nos quais recursos linguístico-discursivos variados podem ser trabalhados. Essas vivências contribuem para o desenvolvimento de uma escrita autêntica, criativa e autônoma.
O eixo Conhecimentos linguísticos consolida-se pelas práticas de uso, análise e reflexão sobre a língua, sempre de modo contextualizado, articulado e a serviço das práticas de oralidade, leitura e escrita. O estudo do léxico e da gramática, envolvendo formas e tempos verbais, estruturas frasais e conectores discursivos, entre outros, tem como foco levar os alunos, de modo indutivo, a descobrir o funcionamento sistêmico do inglês. Para além da definição do que é certo e do que é errado, essas descobertas devem propiciar reflexões sobre noções como “adequação”, “padrão”, “variação linguística” e “inteligibilidade”, levando o estudante a pensar sobre os usos da língua inglesa, questionando, por exemplo: “Essa forma de usar o inglês estaria ‘adequada’ na perspectiva de quem? Quem define o que é o ‘correto’ na língua? Quem estaria incluído nesses usos da linguagem? Quem estaria silenciado?” De modo contrastivo, devem também explorar relações de semelhança e diferença entre a língua inglesa, a língua portuguesa e outras línguas que porventura os alunos também conheçam. Para além de uma comparação trivial, com vistas à mera curiosidade, o transitar por diferentes línguas pode se constituir um exercício metalinguístico frutífero, ao mesmo tempo em que dá visibilidade a outras línguas, que não apenas o inglês.
A proposição do eixo Dimensão intercultural nasce da compreensão de que as culturas, especialmente na sociedade contemporânea, estão em contínuo processo de interação e (re)construção. Desse modo, diferentes grupos de pessoas, com interesses, agendas e repertórios linguísticos e culturais diversos, vivenciam, em seus contatos e fluxos interacionais, processos de constituição de identidades abertas e plurais. Este é o cenário do inglês como língua franca, e, nele, aprender inglês implica problematizar os diferentes papéis da própria língua inglesa no mundo, seus valores, seu alcance e seus efeitos nas relações entre diferentes pessoas e povos, tanto na sociedade contemporânea quanto em uma perspectiva histórica. Nesse sentido, o tratamento do inglês como língua franca impõe desafios e novas prioridades para o ensino, entre os quais o adensamento das reflexões sobre as relações entre língua, identidade e cultura, e o desenvolvimento da competência intercultural.
É imprescindível dizer que esses eixos, embora tratados de forma separada na explicitação da BNCC, estão intrinsecamente ligados nas práticas sociais de usos da língua inglesa e devem ser assim trabalhados nas situações de aprendizagem propostas no contexto escolar. Em outras palavras, é a língua em uso, sempre híbrida, polifônica e multimodal que leva ao estudo de suas características específicas, não devendo ser nenhum dos eixos, sobretudo o de Conhecimentos linguísticos, tratado como pré-requisito para esse uso.
Cumpre destacar que os critérios de organização das habilidades na BNCC (com a explicitação dos objetos de conhecimento aos quais se relacionam e do agrupamento desses objetos em unidades temáticas) expressam um arranjo possível (dentre outros). Portanto, os agrupamentos propostos não devem ser tomados como modelo obrigatório para o desenho dos currículos.
Considerando esses pressupostos, e em articulação com as competências gerais da Educação Básica e as competências específicas da área de Linguagens, o componente curricular de Língua Inglesa deve garantir aos alunos o desenvolvimento de competências específicas.

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