HISTÓRIA NO ENSINO
FUNDAMENTAL – ANOS FINAIS: UNIDADES TEMÁTICAS, OBJETOS DE CONHECIMENTO E
HABILIDADES
O processo de ensino e aprendizagem da
História no Ensino Fundamental – Anos Finais está pautado por três
procedimentos básicos:
1. Pela
identificação dos eventos considerados importantes na história do Ocidente
(África, Europa e América, especialmente o Brasil), ordenando-os de forma
cronológica e localizando-os no espaço geográfico.
2. Pelo
desenvolvimento das condições necessárias para que os alunos selecionem,
compreendam e reflitam sobre os significados da produção, circulação e
utilização de documentos (materiais ou imateriais), elaborando críticas sobre
formas já consolidadas de registro e de memória, por meio de uma ou várias linguagens.
3. Pelo
reconhecimento e pela interpretação de diferentes versões de um mesmo fenômeno,
reconhecendo as hipóteses e avaliando os argumentos apresentados com vistas ao
desenvolvimento de habilidades necessárias para a elaboração de proposições próprias.
O primeiro procedimento implica o uso de
uma forma de registro de memória, a cronológica, constituída por meio de uma
seleção de eventos históricos consolidados na cultura historiográfica
contemporânea. A cronologia deve ser pensada como um instrumento compartilhado
por professores de História com vistas à problematização da proposta,
justificação do sentido (contido no sequenciamento) e discussão dos
significados dos eventos selecionados por diferentes culturas e sociedades. O
ensino de História se justifica na relação do presente com o passado,
valorizando o tempo vivido pelo estudante e seu protagonismo, para que ele
possa participar ativamente da construção de uma sociedade justa, democrática e
inclusiva.
A sistematização dos eventos é consoante com
as noções de tempo (medida e datação) e de espaço (concebido como lugar
produzido pelo ser humano em sua relação com a natureza). Os eventos
selecionados permitem a constituição de uma visão global da história, palco das
relações entre o Brasil, a Europa, o restante da América, a África e a Ásia ao
longo dos séculos. A valorização da história da África e das culturas
afro-brasileira e indígena (Lei nº 10.639/200349 e Lei nº 11.645/200850) ganha
realce não apenas em razão do tema da escravidão, mas, especialmente, por se
levar em conta a história e os saberes produzidos por essas populações ao longo
de sua duração. Ao mesmo tempo, são objetos de conhecimento os processos de inclusão/exclusão
dessas populações nas recém-formadas nações do Brasil e da América ao longo dos
séculos XIX e XX.
Se a ênfase no Ensino Fundamental – Anos
Iniciais está na compreensão do tempo e do espaço, no sentido de pertencimento
a uma comunidade, no Ensino Fundamental – Anos Finais a dimensão espacial e
temporal vincula-se à mobilidade das populações e suas diferentes formas de
inserção ou marginalização nas sociedades estudadas. Propõe-se, assim, o
desenvolvimento de habilidades com um maior número de variáveis, tais como
contextualização, comparação, interpretação e proposição de soluções.
A presença de diferentes sujeitos ganha
maior amplitude ao se analisarem processos históricos complexos ocorridos em
espaços, tempos e culturas variadas. As mesclas entre as histórias da América, da
África, da Europa e de outros continentes apresentam diferentes níveis de
elaboração ao serem trazidos à tona rupturas, permanências e movimentos de
população e mercadorias, mediados por distintas estruturas econômicas, sociais,
políticas e culturais.
As temáticas enunciadas na BNCC, do 6º ao
9º ano, são, resumidamente, as seguintes:
No 6º
ano, contempla-se uma reflexão sobre a História e suas formas de registro.
São recuperados aspectos da aprendizagem do Ensino Fundamental – Anos Iniciais
e discutidos procedimentos próprios da História, o registro das primeiras
sociedades e a construção da Antiguidade Clássica, com a necessária
contraposição com outras sociedades e concepções de mundo. No mesmo ano,
avança-se ao período medieval na Europa e às formas de organização social e cultural
em partes da África.
No 7º
ano, as conexões entre Europa, América e África são ampliadas. São
debatidos aspectos políticos, sociais, econômicos e culturais ocorridos a
partir do final do século XV até o final do século XVIII.
No 8º
ano, o tema é o século XIX e a conformação histórica do mundo
contemporâneo. Destacam-se os múltiplos processos que desencadearam as
independências nas Américas, com ênfase no processo brasileiro e seus
desdobramentos. África, Ásia e Europa são objetos de conhecimento, com destaque
para o nacionalismo, o imperialismo e as resistências a esses discursos e
práticas.
No 9º
ano, aborda-se a história republicana do Brasil até os tempos atuais,
incluindo as mudanças ocorridas após a Constituição de 1988, e o protagonismo
de diferentes grupos e sujeitos históricos. O estudo dos conflitos mundiais e
nacionais, da Primeira e da Segunda Guerra, do nazismo, do fascismo, da guerra
da Palestina, do colonialismo e da Revolução Russa, entre outros, permite uma
compreensão circunstanciada das razões que presidiram a criação da ONU e
explicam a importância do debate sobre Direitos Humanos, com a ênfase nas
diversidades identitárias, especialmente na atualidade. Do ponto de vista mais
geral, a abordagem se vincula aos processos europeus, africanos, asiáticos e
latino-americanos dos séculos XX e XXI, reconhecendo-se especificidades e
aproximações entre diversos eventos, incluindo a história recente.
O segundo procedimento diz respeito à
escolha de fontes e documentos. O exercício de transformar um objeto em documento
é prerrogativa do sujeito que o observa e o interroga para desvendar a
sociedade que o produziu. O documento, para o historiador, é o campo da
produção do conhecimento histórico; portanto, é esta a atividade mais
importante a ser desenvolvida com os alunos. Os documentos são portadores de
sentido, capazes de sugerir mediações entre o que é visível (pedra, por
exemplo) e o que é invisível (amuleto, por exemplo), permitindo ao sujeito
formular problemas e colocar em questão a sociedade que os produziu.
Os procedimentos básicos para o trato com
a documentação envolvem: identificação das propriedades do objeto (peso,
textura, sabor, cheiro etc.); compreensão dos sentidos que a sociedade atribuiu
ao objeto e seus usos (máquina que produz mercadorias, objeto de arte,
conhecimento etc.); e utilização e transformações de significado a que o objeto
foi exposto ao longo do tempo. Esse exercício permite que os estudantes
desenvolvam a capacidade de identificar, interpretar, analisar, criticar e
compreender as formas de registro.
O terceiro procedimento citado envolve a
escolha de duas ou mais proposições que analisam um mesmo tema ou problema por ângulos
diferentes. Tomemos como exemplo a Guerra do Paraguai (1864-1870).
São evidentes e justificáveis as diferenças
do olhar brasileiro e do olhar paraguaio sobre ela. Como símbolo da vitória, os
brasileiros trouxeram para o seu território um troféu de guerra: um canhão
chamado “canhão cristiano”, feito com os sinos derretidos de igrejas do país
vizinho, derrotado na guerra. Hoje, o artefato integra o acervo do Museu
Histórico do Rio de Janeiro. Qual é a relação entre esse objeto e a soberania
nacional? Por que o canhão não foi devolvido, apesar das inúmeras solicitações
do governo paraguaio? O que ele significava ontem? E o que significa hoje? Interpretações
podem ser elaboradas em diferentes linguagens? Como?
Uma guerra pode ser descrita por meio da
enumeração das razões do conflito, da descrição e quantificação das armas
utilizadas no campo de batalha ou, ainda, por meio de um único símbolo.
Canhões, tanques, drones ou mesmo facas: o que esses objetos podem significar
em uma análise histórica?
Pelo exemplo dado, é importante observar e
compreender que a história se faz com perguntas. Portanto, para aprender
história, é preciso saber produzi-las.
0 Comentários